O suíço Leonhard Paul Euler (1707-1783) é um dos maiores génios de todos os tempos na Matemática e na Física. A ocasião da passagem dos três séculos depois do seu nascimento tem servido, na Suíça, na Rússia, na Alemanha (os países onde ele viveu e trabalhou durante longos anos) e um pouco por todo o mundo, para prestar homenagem a um raro talento. A sua obra brilha no século das luzes, o século que viu ser consolidadas e ampliadas as duas grandes criações científicas do século anterior, que estão intimamente associadas - o cálculo infinitesimal e a mecânica de Newton.A marca mais notável da obra de Euler é a sua prodigiosa quantidade. Entre livros e artigos, ela inclui mais de 800 itens, um número absolutamente singular na história matemática. Nunca ninguém escreveu tanto como ele, nem antes nem depois. A “Opera Omnia” de Euler que pretende reunir toda a sua obra num conjunto de cerca de 80 volumes ainda não está, quase três séculos após os trabalhos originais, completa. Curiosamente, foi no século XVIII que apareceram também os mais prolíficos criadores de música: os autores barrocos Johann Sebastian Bach (1685-1750) e George Philipp Telemann (1681-1767) e Joseph Haydn (1732-1809) escreveram cada um deles uma obra musical que um músico de hoje teria dificuldade em copiar durante o tempo da sua vida. O mesmo se pode dizer da obra de matemática e física de Euler. Tal como esses compositores cultivaram vários géneros musicais, também Euler se dedicou a vários ramos da matemática e da física, deixando a sua marca indelével em todos eles.Nascido na cidade de Basileia, na fronteira entre a Suíça e a Alemanha, o jovem viveu em Riehen, uma pequena localidade perto dessa cidade (na altura, uma cidade cosmopolita e muito desenvolvida do ponto de vista científico; basta lembrar que a primeira edição no estrangeiro da “Opera” do nosso maior matemático, Pedro Nunes, tinha sido publicada em Basileia em 1566). O pai era um pastor protestante e a mãe era filha de um pastor da mesma religião. Com essa tradição familiar, não admira que a Leonhard estivesse destinada, através de adequada preparação, uma carreira eclesiástica. Contudo, o jovem cedo revelou o seu invulgar talento para a matemática. Por sorte os pais tiveram a oportunidade de lhe proporcionar uma educação dada por um dos melhores matemáticos desse tempo, Johann Bernoulli (1667-1748), que deu aulas particulares a Leonard juntamente com o seu próprio filho, Daniel Bernoulli (1700-1782). A família dos Bernoulli, que tinha fugido da Bélgica para a Suíça devido a perseguições religiosas (eram protestantes), é famosa na história das ciências por vários dos seus membros terem seguido carreiras – e carreiras bem sucedidas – na matemática e na física. Durante um século, destacaram-se oito Bernoullis nessas disciplinas!
Euler foi o que se pode chamar uma "criança prodígio". Em 1720, com apenas 13 anos, entrou na Universidade de Basileia para aí se formar em Filosofia passados três escassos anos. O seu primeiro artigo científico, escrito aos 19 anos (em 1726), intitulava-se “Constructio linearum isochronarum in medio quocunte resistente” (“Construção de curvas isócronas lineares num meio resistente”). O original foi escrito em latim, que era a língua franca da ciência da época; a maioria dos trabalhos de Euler foram aliás também escritos em latim. Tratava-se de um problema de cálculo de mínimos, um tipo de questões que na época estava muito em voga. Mas nem por isso Euler teve facilidade em arranjar o primeiro emprego.
Acabou por o encontrar no estrangeiro. Juntando-se ao seu colega e amigo Daniel Bernoulli e ao irmão deste Nicolau (II), respondeu em 1727 a uma chamada efectuada por Catarina I (1684-1727), que governou a Rússia após a morte do esposo de 1725 a 1727 para um lugar na recém-formada Academia de Ciências de São Petersburgo, mais tarde Academia de Ciências da Rússia. Em Portugal era, recorde-se, o tempo em que pouo faltava para se completar a Biblioteca Joanina, na Universidade de Coimbra, mandada erguer por D. João V e cuja construção tinha começado em 1917. São Petersburgo, que mais tarde se viria a chamar Petrogrado e Leninegrado, era a cidade que tinha sido fundada em 1703 pelo czar Pedro, o Grande. A Academia dessa cidade foi, por sua vez, fundada por ele em 1724.
Euler ocupou um lugar de professor de Medicina (não esqueçamos que em tempos anteriores também Galileu Galilei e, entre nós, Pedro Nunes tinham estudado medicina), mas não demorou a obter um lugar de assistente de Matemática (ainda em 1727, em substituição de Nicolau, que faleceu nesse ano) e depois de professor de Física em 1731 e também de Matemática (foi o próprio lugar de Daniel, por este entretanto ter regressado à Suíça). Em 1734 casou com Katherine Gsell, uma suíça filha de um artista que também residia em São Petersburgo (que, na altura, atraía, portanto, não só cientistas mas também artistas). Dela viria a ter 13 filhos, dos quais só cinco chegaram à idade adulta. Katherine faleceu em 1773, tendo Euler casado pouco depois com uma meia-irmã dela, de quem não teve descendentes.
Em 1734 Euler publicou o seu primeiro livro: “Mechanica” (“Mecânica”), uma obra notável por juntar pela primeira vez os trabalhos principais de Newton (1643 - 1727) e de Leibniz (1646 - 1716) nessa área da física. Os “Principia Mathematica” de Newton continham raciocínios muito geométricos e o cálculo diferencial newtoniano recorria a uma notação própria, mais complicada do que a de Leibniz (esta é basicamente a notação que ainda hoje se utiliza). A disputa entre Newton e Leibniz sobre a primazia na criação do cálculo infinitesimal foi seguida por uma polémica sobre o lugar de Deus do mundo (havia uma enorme diferença entre o "Deus diligente" de Newton, que tinha se intervir amiúde no mundo para efectuar algumas correcções, e o "Deus preguiçoso" de Leibniz, que descansava para sempre depois de ter feito o trabalho inicial de criação!). Essas disputas impediram que tivesse ocorrido antes uma síntese entre as duas formas de cálculo que, no fundo, eram confluentes.
Em 1741 Euler moveu-se da corte da Rússia para outra corte não menos importante, a corte da Prússia, em Berlim, ocupada pelo imperador Frederico II, o Grande (1712-1786). Na prática, e embora não tendo ocupado o cargo de Presidente da Academia das Ciências da Prússia (fundada em 1700 por Leibniz, hoje Academia das Ciências de Berlin - Brandenburg), Euler sucedeu na direcção dessa instituição ao francês Pierre-Louis Maupertuis (1698 - 1759), o autor do princípio da acção mínima como um axioma unificador da mecânica. Aí se conservaria, numa fase muito produtiva da sua vida. Datam dessa época dois livros notáveis para o desenvolvimento do cálculo infinitesimal, “Introductio in Analysin Infinitorum” (“Introdução à Análise de Infinitos”) (Fig. 9) e “Institutiones Calculo Differentiales” (“Fundamentos do Cálculo Diferencial”), publicados respectivamente em 1748 e 1755 (neste ano deu-se o grande terramoto de Lisboa). É na primeira dessa obra que se encontram a famosa fórmula de Euler para a exponencial de um imaginário puro, que tem como caso particular a identidade de Euler que relaciona os dois números irracionais mais conhecidos, o pi e o número de Euler, com o número imaginário puro e o número real -1 (esta identidade tem sido considerada uma das mais belas expressões matemáticas de todos os tempos). De resto, Euler foi o introdutor de várias notações matemáticas que ainda hoje se usam: o símbolos pi e e são dele, assim como o i. Em Berlin escreveu um livro que hoje é um clássico da divulgação científica: “Cartas a uma Princesa Alemã”(só publicado mais tarde, em 1768). Em 1766, devido a algumas dificuldades na relação com o imperador (Euler não era muito conversador e não brilhava na corte, como outros cientistas e filósofos que frequentavam o palácio imperial – basta referir o francês Voltaire), Euler volta à Rússia, onde agora a imperatriz era Catarina II, a Grande (1729-1796).
Continuou aí o seu labor científico, sem nunca abrandar o ritmo. Publicou em 1768 o livro “Institutiones Calculo Integralis” (“Fundamentos do Cálculo Integral”). Apesar da sua deficiente visão (tinha cegado do olho direito em 1738 devido à realização de experiências de óptica – baseado na realização de experiências, Euler defendia a teoria ondulatória da luz do holandês Christiaan Huygens (1629-1695). Em 1766 cegou do outro olho devido a doença oftalmológica. Um retrato a óleo de 1756 (ver figura de cima) mostra Euler com uma deficiência no olho direito (Frederico II chamava-lhe pouco amavelmente “o meu ciclope”). Ficou célebre a frase que proferiu quando cegou completamente: “Agora tenho menos distracções.” Publicou em São Petersburgo em 1772, o ano da Reforma Pombalina na Universidade de Coimbra, um livro sobre o movimento do nosso satélite natural: “Theoria Motuum Lunae” (“Teoria do movimento da Lua”). Faleceu subitamente aos 77 anos nessa cidade, onde hoje está sepultado, num dia em que tinha não só trabalhado como brincado com um dos seus netos.
Euler foi o que se pode chamar uma "criança prodígio". Em 1720, com apenas 13 anos, entrou na Universidade de Basileia para aí se formar em Filosofia passados três escassos anos. O seu primeiro artigo científico, escrito aos 19 anos (em 1726), intitulava-se “Constructio linearum isochronarum in medio quocunte resistente” (“Construção de curvas isócronas lineares num meio resistente”). O original foi escrito em latim, que era a língua franca da ciência da época; a maioria dos trabalhos de Euler foram aliás também escritos em latim. Tratava-se de um problema de cálculo de mínimos, um tipo de questões que na época estava muito em voga. Mas nem por isso Euler teve facilidade em arranjar o primeiro emprego.
Acabou por o encontrar no estrangeiro. Juntando-se ao seu colega e amigo Daniel Bernoulli e ao irmão deste Nicolau (II), respondeu em 1727 a uma chamada efectuada por Catarina I (1684-1727), que governou a Rússia após a morte do esposo de 1725 a 1727 para um lugar na recém-formada Academia de Ciências de São Petersburgo, mais tarde Academia de Ciências da Rússia. Em Portugal era, recorde-se, o tempo em que pouo faltava para se completar a Biblioteca Joanina, na Universidade de Coimbra, mandada erguer por D. João V e cuja construção tinha começado em 1917. São Petersburgo, que mais tarde se viria a chamar Petrogrado e Leninegrado, era a cidade que tinha sido fundada em 1703 pelo czar Pedro, o Grande. A Academia dessa cidade foi, por sua vez, fundada por ele em 1724.
Euler ocupou um lugar de professor de Medicina (não esqueçamos que em tempos anteriores também Galileu Galilei e, entre nós, Pedro Nunes tinham estudado medicina), mas não demorou a obter um lugar de assistente de Matemática (ainda em 1727, em substituição de Nicolau, que faleceu nesse ano) e depois de professor de Física em 1731 e também de Matemática (foi o próprio lugar de Daniel, por este entretanto ter regressado à Suíça). Em 1734 casou com Katherine Gsell, uma suíça filha de um artista que também residia em São Petersburgo (que, na altura, atraía, portanto, não só cientistas mas também artistas). Dela viria a ter 13 filhos, dos quais só cinco chegaram à idade adulta. Katherine faleceu em 1773, tendo Euler casado pouco depois com uma meia-irmã dela, de quem não teve descendentes.
Em 1734 Euler publicou o seu primeiro livro: “Mechanica” (“Mecânica”), uma obra notável por juntar pela primeira vez os trabalhos principais de Newton (1643 - 1727) e de Leibniz (1646 - 1716) nessa área da física. Os “Principia Mathematica” de Newton continham raciocínios muito geométricos e o cálculo diferencial newtoniano recorria a uma notação própria, mais complicada do que a de Leibniz (esta é basicamente a notação que ainda hoje se utiliza). A disputa entre Newton e Leibniz sobre a primazia na criação do cálculo infinitesimal foi seguida por uma polémica sobre o lugar de Deus do mundo (havia uma enorme diferença entre o "Deus diligente" de Newton, que tinha se intervir amiúde no mundo para efectuar algumas correcções, e o "Deus preguiçoso" de Leibniz, que descansava para sempre depois de ter feito o trabalho inicial de criação!). Essas disputas impediram que tivesse ocorrido antes uma síntese entre as duas formas de cálculo que, no fundo, eram confluentes.
Em 1741 Euler moveu-se da corte da Rússia para outra corte não menos importante, a corte da Prússia, em Berlim, ocupada pelo imperador Frederico II, o Grande (1712-1786). Na prática, e embora não tendo ocupado o cargo de Presidente da Academia das Ciências da Prússia (fundada em 1700 por Leibniz, hoje Academia das Ciências de Berlin - Brandenburg), Euler sucedeu na direcção dessa instituição ao francês Pierre-Louis Maupertuis (1698 - 1759), o autor do princípio da acção mínima como um axioma unificador da mecânica. Aí se conservaria, numa fase muito produtiva da sua vida. Datam dessa época dois livros notáveis para o desenvolvimento do cálculo infinitesimal, “Introductio in Analysin Infinitorum” (“Introdução à Análise de Infinitos”) (Fig. 9) e “Institutiones Calculo Differentiales” (“Fundamentos do Cálculo Diferencial”), publicados respectivamente em 1748 e 1755 (neste ano deu-se o grande terramoto de Lisboa). É na primeira dessa obra que se encontram a famosa fórmula de Euler para a exponencial de um imaginário puro, que tem como caso particular a identidade de Euler que relaciona os dois números irracionais mais conhecidos, o pi e o número de Euler, com o número imaginário puro e o número real -1 (esta identidade tem sido considerada uma das mais belas expressões matemáticas de todos os tempos). De resto, Euler foi o introdutor de várias notações matemáticas que ainda hoje se usam: o símbolos pi e e são dele, assim como o i. Em Berlin escreveu um livro que hoje é um clássico da divulgação científica: “Cartas a uma Princesa Alemã”(só publicado mais tarde, em 1768). Em 1766, devido a algumas dificuldades na relação com o imperador (Euler não era muito conversador e não brilhava na corte, como outros cientistas e filósofos que frequentavam o palácio imperial – basta referir o francês Voltaire), Euler volta à Rússia, onde agora a imperatriz era Catarina II, a Grande (1729-1796).
Continuou aí o seu labor científico, sem nunca abrandar o ritmo. Publicou em 1768 o livro “Institutiones Calculo Integralis” (“Fundamentos do Cálculo Integral”). Apesar da sua deficiente visão (tinha cegado do olho direito em 1738 devido à realização de experiências de óptica – baseado na realização de experiências, Euler defendia a teoria ondulatória da luz do holandês Christiaan Huygens (1629-1695). Em 1766 cegou do outro olho devido a doença oftalmológica. Um retrato a óleo de 1756 (ver figura de cima) mostra Euler com uma deficiência no olho direito (Frederico II chamava-lhe pouco amavelmente “o meu ciclope”). Ficou célebre a frase que proferiu quando cegou completamente: “Agora tenho menos distracções.” Publicou em São Petersburgo em 1772, o ano da Reforma Pombalina na Universidade de Coimbra, um livro sobre o movimento do nosso satélite natural: “Theoria Motuum Lunae” (“Teoria do movimento da Lua”). Faleceu subitamente aos 77 anos nessa cidade, onde hoje está sepultado, num dia em que tinha não só trabalhado como brincado com um dos seus netos.
Fonte: retirado do blog De Rerum Natura
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