Artigo retirado do blog " A educação do meu umbigo "
Os relatos que chegam da reunião na sede do PS entre o PM, a equipa toda do ME, e mais de uma centena de professores socialistas volta a demonstrar até que ponto José Sócrates se tornou intolerante e é incapaz de se libertar de uma auto-imagem de Grande Estadista Visionário.
Pelos vistos a reunião até correu bem, porque só há novas de uma intervenção (em cerca de 30) verdadeiramente a doer. Mas mesmo assim, o Grande Timoneiro parece não ter conseguido ter a paciência necessária para responder de forma dialogante. Lê-se na descrição da ocorrência que:
De acordo com um dos presentes na reunião, uma das três dezenas de intervenções foi de um militante que declarou a José Sócrates que muitos dos professores que votaram no PS em Fevereiro de 2005 não o fariam neste momento.
Segundo o mesmo socialista, o secretário-geral do PS e primeiro-ministro respondeu de forma acalorada que não estava a trabalhar para as corporações, mas para o país e que o país precisa das medidas que o Governo está a tomar.
Tudo bem, as pessoas devem defender de forma «acalorada» as suas posições. Eu faço-o. Mas esta reunião era para ouvir os professores socialistas, ou para os domesticar e calar? Para além disso, julgo que José Sócrates terá uma visão algo redutora do significado de «corporações», aceitando como boa a vulgata corrente de que representam grupos de pressão profissionais. Ora essa leitura, não sendo totalmente errada, é exactamente redutora.
As corporações foram, desde a sua origem medieval, organizações profissionais autónomas de regulação do acesso e exercício de uma profissão. E na História recente, em especial nas derivas autoritárias do século XX, uma forma de organização e controle pelo Estado das actividades profissionais, congregando nas «corporações» patrões e empregados de modo a apresentá-los como aliados naturais na defesa dos interesses da sua actividade e assim reduzir a conflitualidade social.
No caso dos professores não existe nenhuma «corporação» em qualquer dos sentidos, mesmo no popularucho usado por Sócrates. Mas a existir, fica-se sem perceber se o PM confunde «corporação» com «sindicatos» (erro básico, porque nas profissões ditas liberais, os representantes «corporativos» não são os organismos sindicais mas as ordens profissionais), se acha que cada pessoa que defende os seus direitos é «corporativista». Nesse caso seria interessante que se reunisse com os seus correlegionários advogados que não querem abrir mão das suas acumulações, eticamente pouco compatíveis, de actividades políticas legislativas e negócios privados.
Mais útil ainda seria aprofundar a sua aparentemente superficial e equívoca formação política de base.
Mas mais interessante, até para o «país» seria que José Sócrates percebesse que, ao disparar sobre qualquer crítica vinda dos professores, deixando de parte os sinais óbvios de qualquer tipo de recalcamento psicológico que não cabe aqui analisar, nem tenho competência para tal, apenas denuncia os seus toques «corporativos», de alguém que não quer ser «simpático» (e não é) mas que quer manter todo o poder nas suas mãos e apesentar-se como um Cavaco 2.0, agora sem quaisquer dúvidas e sem se enganar nunca. Como não se enganou com o aeroporto, por exemplo. Ou com a política de Saúde na área das emergências médicas.
Isso não é propriamente corporativismo.
É bem pior.
É delírio narcisista, num estado que nem eu - umbiguista confesso - consigo conceber sem ser como resultado de absoluto descolamento da realidade ou de uma reacção algo descompensada resultante de um sentimento profundo de insegurança que só é possível esconder com a recusa de qualquer forma civilizada de diálogo.
Porque provavelmente José Sócrates sabe que está onde está por causa de um atalho da nossa triste historizinha política e agora quer demonstrar que, afinal, tem todo o mérito que poucos lhe reconhecem. Nem que seja à força.
Sunday, February 17, 2008
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