C/ conhecimento ao Conselho Pedagógico e ao Conselho Executivo da Escola Secundária Camilo Castelo Branco
Os professores da Escola Secundária/3 Camilo Castelo Branco, abaixo assinados, vêm, por este meio, chamar a atenção para a situação que passam a expor.
Não é possível pensar a acção educativa sem conceber a sua avaliação, quer se trate dos alunos, dos docentes ou, de um modo geral, de todos os profissionais envolvidos no fenómeno do ensino e da aprendizagem. Como qualquer actividade humana, a educação está sujeita às mudanças que se vão operando no seio das sociedades, estruturadas em paradigmas que variam consoante as épocas. Do mesmo modo, os pressupostos subjacentes ao conceito de avaliação, bem como os instrumentos pelos quais esta se actualiza, devem ser continuamente revistos, numa perspectiva formativa, construtiva, de modo a poder dar uma resposta adequada às exigências que as sociedades modernas hoje nos colocam em termos dos padrões de conhecimento.
Avaliar e ser avaliado sempre foram dois aspectos indissociáveis da condição de professor. Olhando para trás, ao longo das várias reformas educativas, a avaliação foi um direito que, de alguma maneira, foi negado aos professores, na medida em que todo o empenho, profissionalismo, dedicação e qualidade científica que muitos deles sempre puseram no seu trabalho foram submersos na mediania igualitária – não necessariamente justa – de uma menção de Satisfaz.
Vivemos um tempo de mudança. Sabemos que qualquer mudança digna desse nome provoca sempre alguma instabilidade, encontra resistências, causa apreensões. Daí a necessidade e a importância de debater as questões em profundidade, de pensar em conjunto sobre os problemas, de tentar perceber a fundamentação dos pressupostos e operacionalizar os modos da sua articulação à prática.
Numa altura em que o modelo de avaliação de desempenho do pessoal docente está a ser posto em prática à revelia de toda uma classe, não porque os profissionais rejeitem ser avaliados, mas porque exigem uma avaliação construtiva, não burocrática, que não perca de vista o objectivo principal da acção educativa – os alunos e as suas aprendizagens - e que não transfira para os profissionais do sistema o ónus das fraquezas desse mesmo sistema, urge PARAR PARA REFLECTIR.
Está claro para a classe docente que este modelo de avaliação é um modelo atabalhoado, desajustado, burocrático, anti-ecológico – pense-se na quantidade de árvores que vai ser necessário abater para produzir pasta de papel suficiente para todas as evidências, grelhas, fichas que o modelo comporta e obriga – que obriga os professores a desdobrarem-se em múltiplas tarefas cuja finalidade não está sob a sua alçada mas pertence, definitivamente, à esfera do governo que para tal foi democraticamente eleito pelos cidadãos aos quais prometeu as metas que agora tenta, por decreto, afectar aos professores.
É óbvio para qualquer pessoa e, principalmente, para aqueles que vivem, por dentro, a realidade de uma escola ou tutelam essa realidade, que o combate ao insucesso e ao abandono escolares não são da responsabilidade dos docentes, enquanto indivíduos, mas da escola como um todo e do sistema educativo em que se alicerça.
Também o professor não está no terreno a defender pontos de vista ou posicionamentos individuais; faz parte do todo e a sua autonomia esgota-se no cumprimento dos programas e dos curricula delineados pelo Ministério da Educação. Logo, não lhe cabe a ele definir objectivos. Os objectivos de todos os docentes estão definidos, à partida, são comuns a todos os professores e passam, indiscutivelmente, pelo sucesso dos seus alunos. Porém, não está na sua mão garantir resultados. Há todo um conjunto de factores - como o meio onde a escola está inserida, a situação sócio económica dos agregados familiares, a cultura de hábitos de trabalho ou a ausência dela, a falta de expectativas de alunos e encarregados de educação, o papel atribuído à escola na formação dos jovens, vista por alguns como um espaço natural de aquisição de competências e saberes e por muitos como o local onde deixar as crianças e os jovens durante as horas de expediente - que não dependem do professor mas são resultado de anteriores políticas educativas e económicas e de que todos, professores, alunos e a sociedade em geral, sofremos os efeitos.
Estes factores suscitam, igualmente, outras tantas questões:
Nunca antes houve, em Portugal, uma avaliação respeitante à implementação das várias políticas educativas de sucessivos governos. Porquê, agora, imputar aos professores a responsabilidade dos erros dessas mesmas políticas?
Por que motivo a “culpa”, nas palavras da Senhora Ministra, do insucesso dos alunos tem de ser, necessária e exclusivamente, atribuída aos professores?
Que responsabilidade têm os professores na decisão de algumas famílias de retirarem os jovens da escola para, assim, poderem fazer face a uma situação económica desfavorável?
Por que razão os professores têm de se comprometer, no início de cada ano lectivo, com metas que, desde logo, não dependem só de si, como a melhoria dos resultados dos alunos e a diminuição da taxa de abandono escolar?
Numa lógica empresarial de desempenho por objectivos, como se depreende dos diplomas emanados do Ministério da Educação, estando envolvidas no processo três entidades distintas – professores, alunos e encarregados de educação – por que motivo só aos primeiros se exige deveres e se cobra resultados?
Qual a justiça de um modelo de avaliação de desempenho, ADD, que obriga o trabalhador, neste caso os professores, a despenderem inúmeras horas, para além das 35 consagradas nos seus horários, em tarefas burocráticas ou extra curriculares, umas, de formação e investigação, outras, que não são contabilizadas, ou sequer pagas, mas que contribuem, perversamente, para a sua avaliação?
Qual a lógica de um modelo de avaliação docente que:
. avalia do mesmo modo professores em início, meio e final de carreira?
. não respeita a especificidade da área de especialização de cada docente?
. não melhora a qualidade de ensino e não valoriza profissionalmente os professores?
. não contempla a actualização pedagógico-científica dos docentes – preparação de aulas, formação profissional , etc. – ou o seu investimento em formação pós-licenciatura?
. não dá formação, ou fá-lo tardiamente, e apenas a alguns, dos intervenientes no processo?
. impõe quotas quanto à atribuição das menções qualitativas, de acordo com o despacho 20131/2008, condicionando, à partida, os resultados da avaliação e comprometendo a sua imparcialidade?
Num processo normal, bem pensado, bem planeado e minimamente credível, deveria ter havido um tempo previamente estabelecido para reflexão e debate dos objectivos da avaliação, dos diplomas que lhe conferem enquadramento legal bem como dos instrumentos que a servem. Tal não aconteceu e o processo foi imposto unilateralmente.
Em conclusão, é necessário reformular este modelo de avaliação, dando-lhe sentido, credibilidade e eficácia e reparando as injustiças que os diplomas legais impostos pelo Ministério da Educação consagram.
Assim, e enquanto essa reformulação não tiver lugar, os abaixo assinados, tomam a iniciativa de suspender avaliação do desempenho, não entregando os seus objectivos.
Vila Real, 21 de Outubro de 2008
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