Na Infanta Dona Maria só há lugar para o sucesso se a avaliação parar
30.10.2008, Graça Barbosa Ribeiro no 'Público'
Primeira escola pública do ranking, a Infanta D. Maria, de Coimbra, está a ser penalizada pelo abandono dos professores mais experientes.
No Conselho Executivo (CE) da Escola Secundária Infanta Dona Maria, em Coimbra, a presidente é permanentemente interrompida por professores que assomam à porta. 'Gostei de te ouvir!', diz um, desaparecendo logo de seguida; 'Estiveste bem!', elogia outro, passado uns minutos; 'Boa, boa!', solta outra voz, de passagem. Até que, com um sorriso, Rosário Gama explica: 'Devem ter ouvido os noticiários, à hora de almoço. Disse a verdade: que com a instabilidade que aqui se vive, não será por muito tempo nos mantemos como a primeira escola pública no ranking...'A guinada na conversa é subtil. O jornalista pede um comentário ao lugar no ranking - 13º, atrás de doze escolas privadas, considerando aquelas onde se fizeram mais de 50 exames - e Rosário Gama afirma que o estabelecimento de ensino está situado num local privilegiado de Coimbra, cujos moradores, familiares dos alunos, têm um nível sociocultural acima da média e uma situação económica que lhes permite, por exemplo, pagar explicações. Nem há tempo para a segunda pergunta. A presidente do CE fá-la, ela própria: 'Mas será que só aqui é que essas condições existem?' E é igualmente rápida na resposta: 'Não, elas existem em muitos outros lados. O que temos tido em particular, aqui, é uma estabilidade extraordinária do corpo docente, que agora acabou!'. Não passou um minuto e o tema já é a avaliação. E, como consequência desta, 'a avalancha de pedidos de reforma, que', protesta Maria do Rosário Gama, 'tem transformado a escola num inferno'. Numa escola tradicionalmente conservadora, com 95 docentes, 88, ou seja, todos os que estiveram presentes na reunião geral de professores, aprovaram, na segunda-feira, um pedido de suspensão da avaliação de desempenho. Se o pedido fosse aceite, acredita Manuela Carvalho, docente de Matemática, abrandaria o ritmo das aposentações.Eduarda Saraiva, que lecciona Físico-Química e tem 36 anos de serviço, também não duvida de que 'esta avaliação' está relacionada com os pedidos de reforma. 'Querem que eu, que orientei dezenas de acções de formação de professores e escrevi livros sobre a matéria que ensino, vá, obrigada, receber, agora, formação? Ou que faça uma planificação escrita detalhada das aulas - 'dou o conteúdo tal e primeiro digo isto e depois pergunto aquilo' - como fazem, precisamente, os professores inexperientes?'. A conclusão é expressa em tom sereno: 'Não faço nada disso. E daqui a menos de um ano, quando completar os 60, peço a reforma'.O que o desânimo dos professores significa para os alunos está à vista no grupo disciplinar de Eduarda Saraiva. De nove professores vão reformar-se, em bloco, quatro, 'os velhos, os que têm vindo a sustentar os resultados que asseguram um lugar cimeiro no ranking', diz Eduarda Saraiva, explicando que, ao contrário do que é usual, desta vez não há tempo para 'passar o testemunho aos colegas mais novos'.E Físico-Química não é caso único. História ficou sem qualquer professor do quadro e há alunos sem aulas de Português há várias semanas. A presidente do CE conta os que se aposentaram este ano lectivo: sete, fora os que aguardam a data de aniversário para pedir a reforma, os que esperam por resposta e os que recorreram a atestado médico enquanto ela não vem. Talvez aquela situação explique que, entre os alunos, sejam mais os que se preocupam com a falta de professores do que os se entusiasmam com o lugar no ranking. 'Com isso já contávamos...', explicam, com um encolher de ombros. Já há quem faça fila para fazer uma denúncia, como Bárbara Janicas e Catarina Raimão, ambas com 15 anos de idade e no 10º de escolaridade que, depois de três semanas sem professora de História, estão 'atrasadíssimas na matéria'. 'Como é que o ministério permite que uma professora que se vai reformar uma semana depois do início do ano lectivo seja colocada e depois demore três semanas a substituí-la?'. Querem resposta. Terão de fazer exame a História e, se o lugar da escola no ranking não as entusiasma, a nota que daqui a dois anos terão no exame sim, preocupa-as.
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